PODERES PARANORMAIS


Muitas seitas procuram desenvolver "os poderes latentes do homem" acreditando (com boa ou má fé) que esse desenvolvimento possa levar a algum grau de espiritualidade. Podemos encontrar esse preceito no programa da seita Sociedade Teosófica na qual se afirma que um de seus objetivos é "Investigar as leis inexplicadas da natureza e os poderes latentes no homem". É de se notar que o vívido interesse por tudo que possa ter um caráter fenomenal é uma das características mais marcantes do pseudo-espiritualismo.

Os "poderes" que alguém possa ter não são necessariamente indícios de nenhum grau de espiritualidade. Para se compreender a natureza desses poderes, temos que ter em mente a noção tripartite do homem afirmada por todas as religiões reveladas. Segundo essa divisão, o homem consiste de espírito, alma e corpo. Por exemplo, a doutrina cristã os chamava de Spiritus (Intellectus), anima e corpus; os gregos denominavam de Pneuma, psyche e soma; o Islamismo chamava de Ruh, nafs e jism.

Tendo em mente essa divisão, os chamados poderes paranormais processam-se na dimensão anímica e não na espiritual. Os supostos "milagres" que alguém possa realizar não são, a priori, nenhum sinal de espiritualidade. Do ponto de vista do fenômeno em si (pois esses "poderes" são fenômenos que se processam no mundo anímico análogos aos fenômenos que existem no mundo corporal), nada diferenciaria um "milagre" realizado por um santo daquele realizado por um "feiticeiro". Nos dois casos os fenômenos poderiam produzir resultados semelhantes, sendo que a diferença residiria na causa do fenômeno: no primeiro caso, a causa viria de uma influência espiritual; no segundo, essa influência já não existiria. Mas do ponto de vista da concretização do fenômeno não existiria diferença perceptível entre os dois, e é por isso que não se pode ligar de forma causal a produção de fenômenos paranormais com algum suposto estágio ou avanço espiritual da pessoa que os produz. Há, contudo, certos métodos de realização espiritual na tradição hindu onde o guru pode supervisionar o avanço espiritual de seu discípulo, verificando se ele atingiu tal ou qual estágio, pela produção de determinado fenômeno, e essa é de forma geral toda a utilidade que tais poderes podem ter para eles. É exatamente o oposto do que ocorre nos meios pseudo-espirituais onde se buscam tais poderes por si mesmos.

Do ponto de vista do progresso espiritual de um indivíduo, tais "poderes" podem vir a se desenvolver em caráter totalmente acidental e podem se tornar até mesmo um empecilho para o indivíduo, pois muitos acabam acreditando que os "poderes" são sempre um sinal de espiritualidade ou até mesmo que são o objetivo da doutrina espiritual. Na Índia observa-se com certa freqüência tal engano. Pode-se ver nas ruas pessoas demonstrando seus poderes, principalmente na forma de contorcionismo corporal e domínio de certas funções biológicas de caráter involuntário. Essas pessoas são geralmente as que entraram no caminho espiritual, mas ao desenvolverem tais "poderes" acabaram se iludindo quanto a real natureza dos mesmos e se tornaram incapazes de qualquer progresso espiritual verdadeiro. Os sábios da Índia sempre viram tais indivíduos como dignos de pena. O grande santo hindu Sri Râmakrishna disse o seguinte a respeito dos poderes psíquicos: "Quando virdes alguém que exercite qualquer desses poderes, podeis estar certos de que esse homem não realizou Deus, porque o exercício desses poderes requer egotismo (ahamkâra) , que é um obstáculo na senda da suprema realização. (...) Muito útil é a senda da espiritualidade. Deus não pode ser realizado enquanto houver no coração o menor desejo de poderes. Não podeis enfiar uma agulha enquanto houver fibras na ponta da linha". (Evangelho de Râmakrishna , cap. XI)

Há ainda certos casos de pessoas que possuem certos "poderes" de forma natural, sem nunca terem procurado desenvolvê-los e sem nunca terem praticado nenhuma disciplina psico-fisiológica (como o hatha-yoga). Do mesmo modo como afirmamos mais acima, estas pessoas também não devem se iludir quanto à verdadeira natureza das habilidades que possuem. Pode até mesmo ser o caso delas serem obrigadas a suprimí-los totalmente (na medida em que for possível) se elas desejarem seguir um caminho espiritual autêntico.

Por último, convém assinalar que certos santos às vezes fazem uso de tais "poderes", mas quando isso ocorre eles nunca os usam em benefício próprio ou para se exibirem, e se conhecem casos em que o exercício dessas habilidades acaba por debilitar fisicamente essas pessoas, chegando mesmo a estados de saúde bastante graves. Mesmo em uma situação dessas, o verdadeiro santo não irá nunca usar os próprios "poderes" para se curar ou para amenizar suas dores.